Arquivo do dia: 30/07/2009

Candidatura de Estado

O Form 990 é um documento a ser preenchido pelas entidades sem fins lucrativos, nos Estados Unidos. É o maior controle de doações da rigorosa receita do país mais rico do mundo. O Comitê Organizador de Chicago 2016 ainda não apresentou o seu relatório de 2008 e joga nuvens sobre os números da campanha favorita na disputa pelos Jogos Olímpicos.

O Chicago Tribune (aqui, em inglês) ouviu um dos 50 vereadores da cidade que expôs uma temeridade que só tem aumentado, nos dias que precedem a eleição de 2 de outubro. Na mesma reportagem, o representante do Comitê de Chicago falou que não havia qualquer problema e que requereram “mais tempo [à Receita-IRS] porque outras coisas precisavam ser feitas até o fim de agosto”.

Mas acontece que o Comitê pede uma prorrogação até meados de novembro, um mês e meio depois das eleições de Copenhague, quando qualquer declaração à Receita norte-americana, não trará prejuízo à campanha dos Estados Unidos.

O vereador do primeiro distrito de Chicago, Manny Flores, ficou desconfiado. “Eu reconheço que o Comitê 2016 está envolvido em sua candidatura, porém isso levanta questões sérias,” disse. Esse representante quer aprovar no Conselho Municipal (a câmara de vereadores deles) um dispositivo que limita os gastos do Município em 500 milhões de dólares, a única despesa assumida oficialmente por Chicago, até agora. “Se somos sérios sobre a proposição dos Jogos, nós precisamos nos manter responsáveis. [O formulário 990] é um requerimento de padrão básico,” disse o vereador, estranhando o porquê do suspense.

Mas o Comitê norte-americano trabalha nesse momento para fechar uma equação que parece simples para os brasileiros, acostumados com o parternalismo do estado (que pode ser conveniente para nossas autoridades). Lá é mesmo diferente, embora nesse momento a gestão do COI esteja muito mais próxima aos ditames estatais. O apoio governamental tem um peso cada vez mais fundamental, nessa escolha. É aqui, nas garantias de estado – e na força da TV, também, que se decide a eleição das sedes olímpicas.

Justamente os dois últimos vacilos de Chicago. New York, que ainda tinha a TV a seu favor – sendo que a NBC fechou contrato com o COI em 2004, um ano antes da escolha da sede de 2012, caiu sem chegar à disputa final, pela sentida ausência de Bush – ao contrário de Blair e seu levante pró-Londres.

A coisa é tão séria, no quesito promiscuidade entre o movimento olímpico e o poder público, que, em um encontro hoje, entre os organizadores de Madri e o presidente da Espanha, José Zapatero, ficou sacramentado o papel do governo na proposta madrilenha que, nas palavras do prefeito Gallardón, é uma “candidatura de estado” (aqui, em espanhol).

O coro ensaiado na reunião com Zapatero definiu que a máxima de Madri, seria o completo apoio do Estado e ficou definido, assim, que a aposta brasileira será mesmo a pauta principal até 2 de outubro.

Se for assim, Obama não pode fazer muito, segundo uma aposta antiga dos organizadores do Comitê de Madri que até preveem a presença do presidente dos EUA, em Copenhague. Os espanhóis avaliam que o poderoso líder norte-americano não terá cartas na manga, na dependência de aprovações do Congresso norte-americano, ainda segundo Samaranch Jr., o único votante espanhol do COI, em claro momento de desdém.

Obama não teria o que mostrar? Se a resposta for negativa, esse sim seria o pior cenário para Chicago.

Mas, um fator, o Comitê dos norte-americanos tem administrado com um sucesso inconteste: como favorita, Chicago tem levado tiros de todos os lados e sobrevive nas cabeças, apesar disso. É a melhor gestão de crise até aqui. Socorrem daqui e dalí e podem chegar em outubro com arranhões, quando, em outro alvo, já seria o decreto de morte (imagem o Rio bombardeado assim…).

Aliás, o Rio deve evitar qualquer sinal de oba-oba (deixem o papel de torcida para as comunidades e fóruns da internet, sendo que os brasileiros já dominaram todos, o que inclui o GamesBids).

Nesta semana, a coluna Gente Boa, do Globo, publicou nota revelando que o governador do Rio, Sérgio Cabral, determinou para sua secretária de Cultura que definisse seis pontos da cidade onde seria comemorado o resultado de 2 de outubro. É óbvio que o governo tem que preparar o terreno para manifestações populares (preparar a segurança, acima de tudo), mas a antecipação fez o jornal carioca interpretar a ação de outra forma.

E o Globo pipoca o bom momento do Co-Rio (sendo que a Folha já havia feito o mesmo), no momento que o The New York Times desanca com as contas de Chicago – algo que já devia ter comentado no início desta semana (e a reportagem está aqui, em português).

O maior dos jornais americanos vê crescer o movimento contrário aos gastos da cidade com a campanha pelos Jogos. O site No Games é citado e faz mesmo muito barulho e o TNYT cita ainda a reprovação dos chicagoans. 75% são contra o uso do dinheiro público, segundo enquete do Chicago Tribune, reproduzida nessa outra reportagem.